abril 26, 2007

De Guernica a Baghdad

As convicções são as vilãs por trás da incapacidade mental atribuída ao passar dos anos
Manellis


As convicções são âncoras que jogamos toda vez que o mundo das idéias parece sacolejar demasiado o nosso barco existencial. Agarramo-nos a um raciocínio, na maioria das vezes falho, para "protocolarmos" nossa conduta e evitar assim a dúvida que tortura com aguilhões e provoca uma dor tanto maior quanto seja o cansaço da mente sobre a qual se assenta.
Convicções são muletas que muitas vezes sabemos quebradas antes mesmo de usá-las pela primeira vez. A sua existência é um ardil tão grande dos mecanismos da mente que até mesmo a disposição ferrenha de não ter convicções, não cultivá-las ou perpetuá-las é, em si...uma convicção!
Convicted em inglês, significa preso!
Toda convicção é uma cerca que nos impede de ir a algum lugar!
Criamos convicções para:
- Protocolar o quotidiano,
- Minimizar dúvidas,
- Economizar energia mental,
- Fugir da liberdade
- Exercer o livre direito de se manter ignorante
Observe, como quem não quer nada, o público de uma livraria, de uma locadora ou de uma loja de discos.
Repare na desfaçatez e na sofreguidão com que alguns freqüentadores destes locais olham para seções que lhes parecem bloqueadas por uma parede invisível que os seduz pela virtualidade:
- O homem de meia-idade que evita a ala de cinema nacional
- O jovem com perfil nerd que não ousa pegar um musical
- A garotinha em roupas pretas (góticas?) que simula asco pela seção de filmes como High School Music
- Aqueles que evitam a seção de romances e acham que só as biografias são dignas de leitura
- Outros tantos que evitam biografias e só se "drogam" com romances
- O roqueirinho que não quer nem mesmo ser visto pegando em um disco de MPB
Bem, exemplo é o que não falta e até mesmo eu, que sempre me senti um assassino convicto de convicções (Ops!), freqüentemente me pego regando com carinho uma convicçãozinha ou outra que teimam em crescer inadvertidamente no meu jardim de idéias livres!

Seção conselhos do Morpheus

Nunca discuta com um real convicto,
Se ele for um profissional do ramo, depois de algumas manobras evasivas ele o levará para o seu jardim e o vencerá com experiência.
Lembre-se, mais sabe um idiota em sua casa que um sábio em casa alheia!

Fim da seção conselhos do Morpheus

Pois é, foi cheio de convicções que, quando vi o mural Guernica pela primeira vez (Museu Reina Sofia, Madrid), enunciei, convicto, do alto da minha ignorância:
Achei uma merda!
(Risos!)
O tempo passou e o simbólico contido nesta maravilhosa síntese de horror à guerra (e às convicções nela contidas) me fascina como se fosse uma espécie de "Águas de março" da pintura.
Setenta anos se passaram após esta obra, pintada em tempo recorde (quase uma anafilaxia), e ela continua atual sem que nada impeça que a imaginemos saindo do atelier de uma artista iraquiano naquele inferno que se estabeleceu pra lá de Bagdad


























Armas de destruição em massa, inexistência do efeito estufa, combate real ao terrorismo, segurança da América, proteção da democracia...quantas convicções!
Convicções tais como a carroça que suspende o jegue no início do post!

Se voçê nunca parou para analisar Guernica, ou simplesmente não o aprecia, como eu não o apreciei na primeira vez que o vi, vai abaixo uma série de chaves do simbolismo do quadro:

O touro
Picasso sempre foi fascinado pelas touradas, velho esporte espanhol, brutal e espetacular,
e as imagens da arena de touros aparecem com freqiiência em seu trabalho. Embora Picasso afirmasse que o touro em Guernica representa a brutalidade, trata-se de uma imagem ambígua. Parado e abanando a cauda, o touro não parece selvagem. Talvez Picasso tivesse em mente o momento da tourada em que, após um ataque bem-sucedido, o touro recua para ver o que fez e prepara seu
próximo movimento.

Ausência de cores
A pintura severa, monocromática, é adequada ao tema. Até hoje o assunto deste mural provoca polêmica na Espanha. Essa enorme tela está exposta numa sala própria no Museu Rainha Sofia, protegida por um imenso vidro à prova de balas.

Mãe e filho
Uma criança morta pende dos braços da mãe. Entre as complexas imagens cubistas de Guernica, esta pode ser interpretada de imediato. O grito da mãe está representado pela sua língua, que sugere um punhal ou um caco de vidro. Outros cacos semelhantes aparecem por todo o quadro.

A cabeça cortada
No primeiro planohá uma figura fragmentada, com a cabeça decepada à esquerda e ao centro um braço cortado segurando uma espada quebrada. É possivel que seja uma referência à batalha de San Romano (de Uccello). Picasso contrasta a guerra cerimonial com um assassinato em massa.

Cavalo em agonia
Picasso raramente interpretava sua iconografia mas deixou escapar que seu cavalo representa o povo. A língua em ponta de punhal significa a agonia vista pela lâmpada que pende logo acima como o onipresente olho de Deus .

A flor

A única flor do quadro, em traços singelos e delicados, representaria a esperança inexterminável.

Os rostos

O cavalo ferido é uma alusão secularista à descida da cruz quando as três Marias comtemplavam desoladas o corpo ferido de Jesus (o cavalo ferido!).

Figura com os braços levantados
Alusão a Goya: O fuzilamento de 03 de maio de 1808

A pequena arte diverte
A arte mediana eleva
A grande arte liberta
Fernando Pessoa

Um comentário:

Emmanuel disse...

Bien sûr Manellis,
maintenant, la peinture Guenica ne sera pas jamais une simple peinture. Elle sera vu inserée dans un novel contexte historique que fus retractée par Picasso avec toute la douleur souffrée par les spagnois.
Merci,
Emmanuel

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