Esta semana, li uma entrevista de Carl Lewis, "O filho do vento", na qual ele explicava a sua vontade de voltar ao esporte: acha que o doping e a busca de resultados minaram todo o valor do esporte olímpico.
Uma decisão super elogiável mas um pouco romântica.
O mundo está pós-modernamente incompreensível para o eternamente moderno Lewis.
O doping atual anda milhas à frente dos métodos de detecção, os atletas não são mais instrumentos de idologias políticas e sim do comércio de material esportivo que vende a ilusão de que se seu filho obeso calçar os tênis do último campeão, tudo estará remediado. As fortunas necessárias a transformar atletas ambiciosos em arrimo das três próximas gerações podem ser ganhas de uma hora para outra. Então, por quê não arriscar?
Danem-se joelhos, rins, cérebro, cultura e o risco de câncer precoce.
O mundo muda rápido sob a batuta do dinheiro e o ser humano de 50 anos mais atualizado a caminhar sob o planeta está a séculos de distância de entender os conceitos que se processam de forma caótica na matriz cognitiva da sociedade de consumo e que vão determinar se o próximo cometa brilhante será visto por seres humanos ou apenas por baratas resistentes à radiação.
Ainda nesta mesma semana acusei alguns golpes de estranhamento:
-A ascensorista de um hospital o qual só visito às quartas-feiras me parece cada vez mais com alguém que eu vejo todos os dias; um claro sinal de que minha semana está voando debaixo dos meus olhos. Esta sensação tem seu antagonismo nos posts regulares que me parecem frear um pouco o fluxo do tempo.
- Uma coleção inteira de Jimi Hendrix foi parar dentro de cd de mp3 e eu ainda não consegui ouvi-la atentamente como gostaria apesar de estar rodando fixamente no meu toca mp3 há 2 semanas!
Conclusão: pessoas como eu estão administrando mal o fluxo do tempo e de informações, ou melhor de disponibilidade de informações. O conflito entre a finitude de tempo disponível e a infinidade de informações desejáveis chegou para ficar!
A angústia criada pela fácil acessibilidade ao conhecimento é causa constante de apoplexia em pessoas que, como eu, passaram boa parte da vida lendo apenas o que estava (pouco) disponível. Filosofar é preciso, como for possível!
Adicionalmente, o fim de semana deixou de ser um motivo válido para enfrentar a semana de trabalho para muita gente que passou a infância pensando a semana como uma penitência para o relax do sábado e domingo e, como se não fosse bastante, amigos analistas referem que muitos pacientes os procuram por reconhecer, conflituosamente, que, embora continue a ser instrumento de poder e auto-estima, o sexo não é nem de longe a coisa mais prazerosa que experimentam no dia-a-dia.
Tudo isso que, até ler este post, você pensava ser pertinente apenas à sua vidinha de ser humano comum é na verdade uma sensação ubíqua que pode estar por trás de muitos fenômenos sociais agora em foco como, por exemplo, a violência urbana, consumo de drogas e crise de valores.
Isto se chama pós-modernidade e, parafraseando o oriente médio, Baudrillard é seu profeta!
Crítico da sociedade de consumo e da massificação das relações humanas, o sociólogo francês Jean Baudrillard, que morreu há uma semana aos 77 anos, foi um dos pensadores mais presentes, e contestados, no debate público desde o fim dos anos 1960. Noções como simulacro e hiper-realidade ganharam o mundo por meio de seus escritos e de suas intervenções, como na série "Matrix", embora afirmasse que esta foi "uma interpretação incorreta de sua obra" Germanista de formação, iniciou a carreira na Universidade de Paris, em Nanterre, que vivia a ebulição do pré-Maio de 68.
A partir daqui eu poderia seguir num resumo biográfico que não faria nada mais que chover no molhado frente a abundância de material disponível na imprensa nestes dias após a sua morte.
Gostaria no entanto de re-reverberar aqui, a divulgação de alguns conceitos chave de sua obra, resumidos abaixo:
Sociedade de consumo (preocupação principal das primeiras obras de Baudrillard): necessidades, forças e técnicas naturais são substituídas por um sistema em que os objetos de consumo dão forma e significado à vida cotidiana.
Pós-modernidade: vazio deixado pelo desaparecimento das ideologias e dos limites da modernidade (Baudrillard recusava o rótulo de "pós-moderno).
Simulacro: Enquanto o mundo moderno era organizado em torno da produção, o mundo pós-moderno é regulado pela reprodução, pela simulação. Diferentemente da imitação ou do fingimento -casos em que a diferença entre produto e realidade se mantém-, o simulacro (a TV, a realidade virtual) confunde realidade e ilusão.
Hiper-realidade: mundo dos simulacros em que as pessoas vivem, a sociedade de imagens -idealizadas pela TV, rotuladas pelos meios de comunicação de massa e distantes do cotidiano do trabalho- que substitui a sociedade de classes e do trabalho.
Fim do trabalho: o trabalho deixa de ter valor em si, aparecendo apenas como mais "um signo entre outros", um sinal de status ou modo de vida.
Sedução: com rituais ambíguos, opõe-se ao conceito de "sexual" -este está associado à produção. A sociedade burguesa teria subvertido a ordem original, em que a sedução viria primeiro. Ao tentar resgatar o conceito de sedução, no final dos anos 1970, Baudrillard o associou ao feminino, criticando, porém, o feminismo.
Orgia e pós-orgia: a expansão cultural moderna aparece como "orgia". Baudrillard ressalva não se tratar de liberação, mas de "metáfora da liberação" manifesta na sociedade moderna. A sociedade contemporânea, portanto, viveria a pós-orgia, a reação a essa explosão -uma implosão.
Implosão: nomeia o colapso da diferenciação entre os planos econômico, político, artístico etc. Na sociedade da simulação, a economia e a vida "reais" não se diferenciam mais dos simulacros; a sexualidade permeia tudo.
Transestética (conseqüencia da implosão): ao mesmo tempo em que a arte tudo permeia, ela deixa de ser entendida como fenômeno próprio e seu poder de oposição à realidade desaparece, juntamente com suas normas.
E aí?
Achou Matrix dentro destes conceitos?
O que dizem a respeito da sua vida atual?
Até mais!
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