Kátia Queiroz Mattoso, que posteriormente viria a escrever o excelente " Da Revolução dos Alfaiates à Riqueza dos Baianos no Século XIX" , faz a apresentação descrevendo o livro como um álbum que revive uma Bahia quase perdida, mas que não queremos esquecer ( o incrível, para mim, é ter visões desta Bahia quando ouço as músicas de Dori, notadamente do CD Brazilian Serenata).
O livro contém fotos que eu possuía, aos fragmentos, na minha memória por ter vivido minha infância nos anos 60 quando um pelourinho, bombardeado pelo tempo, mas ainda em pé (ou quase!) era o local escolhido pela prefeitura de Salvador para alocar algumas repartições numa das quais, meu pai trabalhava.
O baixo meretrício que dava a fama (má) ao lugar, me era invisível e eu freqüentemente me sentia em uma outra época (boa) ao caminhar pelos becos que levavam à repartição de meu pai.
O livro foi um reencontro com estas imagens que eu colorizava mentalmente e às quais, também mentalmente, adicionava o cheiro de lixo, frutas, mofo e urina que emanava das ruas, bueiros e das portas entreabertas.
Da janela do consultório de um médico oportunista se ouviam os gritos dos clientes das damas locais que, acometidos por alguma uretrite incapacitante, tinham então o seu encontro marcado com o "beniquet": uma cureta usada para RASPAR a uretra do desavisado portador do gonococo que agora tinha três evoluções possíveis: reincidir na gonorréia, desenvolver uma estenose e urinar em gotas ou pior, as duas coisas.
Memories, memories.
Um livro de Verger complementaria essas memórias: Retratos da Bahia, pela editora Corrupio.
Fotos mais recentes mostram o baiano típico numa Bahia viva entre os dois momentos de globalização que a encurralalam entre o pós-guerra e a onda atual.
Sobre eles, livro e autor, Jorge Amado escreveria:
No ano 1946, vindo de todos os caminhos e encruzilhadas do mundo, chegou à Bahia um exú dos melhores. Chegou com seus olhos cor de mormaço cheios de perguntas, um baú de lata e uma roleiflex pendurada no pescoço.
Naquele tempo era francês e não sabia do encantamento que o prenderia à Roma Negra de Bastide (outro francês)....
Você verá um Retratos da Bahia que vem se completando por 34 longos anos de vivência intensa e amor pela cidade. Um retrato profundo e denso de seu povo, de suas alegrias, suas festas e suas crenças, onde as gentes da Bahia são sempre a primeira personagem do drama, da sátira ou da farsa que se representa nos diferentes momentos da vida. O pano de fundo é a belíssima arquitetura baiana, suas igrejas, fortes, sobrados ou bairros populares. Seus arvoredos sagrados, que, com sua sombra, dão força à límpida água das quartinhas e seu mar....
Bom, eis que chega às minhas mãos esta semana, o excelente: Retratos de um tempo, por Antônio Risério e Floro Freire. Trata-se de uma reconstrução visual da Bahia antiga através de intervenção gráfica por computação sobre documentos iconográficos da época; alguns destes documentos são fotos do primeiro livro do qual falei: "Bahia - Velhas fotografias - 1858 a 1900 por Gilberto Ferrez".
A reconstituição, feita em DVD e disponível a partir do site Retratos de um tempo, merece ser conferido pelo valor estético e documental da obra que explica de forma agradabilíssima o que todo baiano (de nascimento e coração) tem que saber sobre sua terra: Um kit completo de baianidade erudita!
A localidade de Paraguaçu ou Kirimuré, como os índios a chamavam, dá lugar a uma capitania que mal gerida passa às mãos da coroa que decide criar uma cidade para que o Brasil comece a existir: surge a vila do Pereira e posteriormente uma cidade administrativa cujos operários envolvidos em sua construção ainda dormiam nos barcos que os haviam trazido de Portugal dada a precariedade da proto-cidade.
Chega um Governador geral e a cidade toma corpo expandindo-se pelo horizonte do voyeur que adentrava a baía de todos os santos como uma cidade que, nos dizeres de um deles, escreve, na paisagem, o seu nome por extenso!
Compre o DVD e assista com a família. A Bahia que lhe parece bela vai ficar mais linda ainda. Se você tem uma veia poética poderá se surprender com os poemas e histórias que pipocarão na sua cabeça ao assistir as imagens da forma como estão apresentadas.
É um destes trabalhos que, pelo seu valor real, tem preço praticamente simbólico.
Morpheus saúda a iniciativa que teve seu lançamento há quase um ano (29/03/2006) com apoio do Governo do estado e que agora aparece neste hebdomadário caótico (que só nasceu em novembro passado!).
Incontidamente, peço-lhe que repare:
O casarão baixo estava na esquina onde hoje se encontra o Teatro Castro Alves: compare com a imagem que este local tem agora e imagine-se andando por lá...
Que viagem hein?
A Bahia que inspirou Amados, Caymmis, Vergers, Carybés e tantos outros está um pouco dentro destas imagens que você deve conhecer para não se queixar mais de falta de inspiração!
Infelizmente... o post tem que acabar! pois, como diz o sub-título do blog, tempori fugit.
Incluí na na coluna direita uma scrollbox do metafilter, um dos primeiros e mais populares dentre os blogs do mundo: notícias variadas de sites do mundo inteiro; cheque e tente se perder no mundaréu de posts bizarros.
Morpheus loves such a thing!
E prá finalizar, mesmo: Paco e McLaughin em Frevo rasgado de Gismonti!
Toda vez que eu acho que estou tocando bem, alguém me manda um link como este vídeo: visto as sandálias da humildade!
Mais por vir,
Inté.
Manellis
Um comentário:
Pois e' muito bem....Sem duvida tocam super bem ou melhor dizendo super herois da guitarra.
Porem vejo a musica por um outro lado. Um desafino, uma voz diferente, uma maneira de tocar estranha (ate' errada se quiser)....Tem que ter um algo mais. Imperfeiçoes sejam bem vindas !
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