dezembro 04, 2010

De magos e enforcados

O ano adentra enfim o seu derradeiro mês.
O universo cicla sua espiral do tempo que, assimetricamente, só admite o futuro como possibilidade.
Adentramos o futuro em parafuso da mesma forma como as espirais do DNA perseveram egoisticamente pouco se importando em descartar nossas carcaças e intelectos.
Janeiro, dentro em pouco, estará nos batendo à porta e seduzindo a prometer mudanças.
Ao pensar sobre este ciclo de 12 pedaços que é o ano, lembrei-me das 12 primeiras cartas do tarot.
Muito mais que ferramenta mágica ou assemelhada, o tarot é uma galeria arquetípica de simbolismo pictográfico.
Bem utilizado, é uma excelente ferramenta de introspecção e auto-conhecimento infelizmente inacessível para muitos (demanda cultura) e rejeitada por outros tantos por motivos dos mais diversos.
Porém muito mais que uma apologia ao tarot, a minha idéia ao pensar no tema morfético para este post era a de focar no dezembro e no  janeiro do tarot: respectivamente a carta do enforcado (a de número 12)  e a da temperança (nº14).
Veja o enforcado, contemple-o!
O enforcado está de cabeça para baixo, pendurado por uma perna, sozinho e aparentemente calmo.
No meio da carta ele olha de frente e equilibra-se pendularmente usando a mais poderosa força do universo: a gravidade.
Abaixo, um abismo cuja existência sempre foi suspeitada só agora pode ser encarado de frente.
Ainda assim ele parece calmo.
O mundo está sendo visto sob um novo prisma e isto parece agradá-lo
O enforcado chega a este constrangimento depois de ter vagado pelas 11 primeiras estampas do tarô de forma mais livre.
Agora, de cabeça para baixo, ele cruza as pernas num 4 invertido como que a negar a autoridade do rei da carta 04.
Maduro, neste final de ciclo ele já não liga tanto para o material que tanto o encantava quando foi rei  e olhava para a esquerda (o passado) regozijando-se por  suas vitórias.
As moedas lhes caem dos bolsos e ele não se importa.
Seu olhar tranquilo vem da maturidade e da saúde espiritual que conquistou.
Pendente como está, pode olhar para seu coração tendo as estrelas como pano de fundo: ele pode final e etimologicamente considerar! (pensar com as estrelas).
Tão confortável parece que às vezes acho que se colocou aí sozinho!
O enforcado, no entanto, não está protagonizando nenhum epílogo.
Ainda lhe resta mais um bom pedaço de jornada nas cartas que se seguem à de número 13 (a morte).
Confrontos e vicissitudes o esperam assim que ele dobrar a esquina da transformação representada pela carta da morte.
Para chegar à epifania da última carta, haverá de escutar muitas e muitas vezes a letra de “Se eu quiser falar com Deus” de Gil.
A calmaria e passividade da situação é apenas uma imposição da natureza para que possa mudar a direção do vento
Sua jornada daqui  para frente será no interior da mente e para pairar sobre os abismos não poderá carregar pesos desnecessários.
No início do caminho, um mago mostrou-lhe o céu e a terra com cada um dos braços postado atrás de uma mesa com ferramentas.
Parecia dizer-lhe: preste atenção nas analogias entre o que está em cima e o que está embaixo. Se utilizar as ferramentas que o destino lhe deu poderá ser, como eu, um mago!
Ele venceu todas etapas como um Hércules em busca da redenção e agora aguarda passivamente a transformação que vai iniciar-lhe na segunda parte da jornada.
Janeiro vai chegar e com ele, para mim, a lembrança da carta da temperança.
Sua mensagem é a da frugalidade do saciado.
Agora é tempo de pequenas e saborosas porções; da administração de recursos; de muitas madeleines proustianas.
Tudo terá que ser dosado se quisermos a redenção que é a conquista do mundo.
A redenção, como numa anunciação de Giotto chegará com a revelação da boa-nova.
O Natal é isso.
Uma anunciação.
Como se todos fôssemos Marias!
Feliz dezembro a todos.
Desde o Dia do Samba (02/12) até o Reveillon(s) que, em francês, é o imperativo do verbo acordar.
Quem devemos acordar?
O ano que chega ou nós mesmos?
Por via das dúvidas, acordemos os dois!

P.S. Há 10 anos fiz o Caminho de Santiago e pela primeira vez esta história de analogias e vivências concêntricas pareceu-me realmente clara.

P.P.S.  Tem me faltado tempo para blogar porque ando muito ocupado aproveitando os dias maravilhosos deste fim de primavera!

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