novembro 11, 2010

A vida que continua

Dentre os amigos mais recentemente incorporados em minha vida com este  impulso tardio pelo surf, um é realmente especial.
Trata-se do querido Flávio Marola.
Veterano, gentil e de boa técnica, Flávio cupa esta posição ímpar por sua condição orgânica especial: transplantado renal!
Isso mesmo!
Enquanto muitos chafurdam em poços infinitos de auto-comiseração mesmo depois de terem recebido a benção de um transplante exitoso, Flávio estica a linha mais ainda para o outro lado entregando-se regularmente à prática de um esporte de alta performance como nas nossas sessões de surf que chegam a durar 4 a 5 horas!
Flávio mantém o site "Doe órgãos , doe vida" (http://www.doeorgaosdoevida.com.br/)e milita pela conscientização da importância de doar órgãos.
Em feijoada recente da qual foi anfitrião, Flávio pediu-me que escrevesse algo sob a visão de um médico transplantador.
Poderia começar por falar do que é bom.
Vamos lá!
Transplantar não é coisa fácil.
Precisa de leis
De critérios
De condições técnicas para o transplante e para o suporte pós-transplante
Precisa de equipes
Várias!
Organização, preparação, captação, transplante, suporte intensivo, suporte clínico, terapia anti-rejeição etc...
Precisa de tesão dos envolvidos.
Todos!
Família, paciente, doadores, equipes e mais uma vez, etc...
Por incrível que pareça, como bom país esquizóide que sempre foi, o nosso Brasil tem tudo isso.
Leis, hospitais, equipes...
Para nós médicos, a conclusão de um transplante é um momento de extrema realização profissional.
Algo que nos permeia com uma sensação de utilidade e bom poder.
A sensação de ter feito parte de um evento que vai mudar completamente a vida de uma pessoa que vivia num inferno orgânico para uma existência mais digna como prova com sua disposição, o nosso Marola
Entraves burocráticos, de remuneração dos envolvidos e na conscientização dos potenciais doadores, no entanto, terminam por emperrar uma máquina que poderia estar funcionando, principalmente nesta Bahia de meu Deus, a todo vapor.
Se quisesse citar coisas ruins poderia passar dias escrevendo e terminar o texto a base de antidepressivos, mas não farei isto.
Vou registrar apenas algo que muito me toca quando acontece e que agrega uma péssima imagem ao programa de transplantes: o descaso e mesmo uma certa perversidade com as famílias de doadores que passam por uma dose extra de infortúnio após a extração do órgão de seus parentes. Dificuldades de todo tipo frequentemente  prolongam o sofrimento daqueles (família e doador) que deveriam receber honras de heróis.
Que os responsáveis se lembrem disso e facilitem de forma prioritária a liberação do corpo e o funeral.
Mimos outros, que não dinheiro é claro, também seriam bem-vindos!

Pronto,

Recado dado!

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