março 15, 2008

Idéias em Transe

Terça-feira, dia de Ogum, Marte (Mardi) e tudo quanto é santo guerreiro;
Dia 18, número da carta da lua no tarô, a tripla duplicidade da trindade, escoltado entre os lindíssimos primos gêmeos 17 e 19;
Mês de Março, March; mês de marte;
Neste ano que começou numa Terça-feira!

Chega!

Nesta terça-feira dia dezoito de março, inaugura-se no TCA o ciclo de palestras internacionais sobre arte e linguagem promovido pela Braskem: Fronteiras do Pensamento
Enxergo neste evento algo que poderá vir a ser um divisor de águas para a cidade de Salvador capaz de nos retirar da nossa endogamia intelectual causada pelo isolamento.
Os convidados podem ser conferidos no site do Fronteiras e também no belíssimo caderno especial com o qual nos brindou o jornal A Tarde nesta última sexta-feira.


Infelizmente, só os primeiros 50 compradores do passaporte poderão assistir à palestra de Bernard Henri-Levy (se você nem sabe quem é vá ao site!). Os outros 1450 convites serão distribuídos pela patrocinadora do evento.
Se você pegou a dica de Morpheus e comprou o seu cedinho, parabéns!
Nesta manhã de sábado, gloriosa pelo sol e infernal pelo calor que dele emana, coloco aqui o texto de minha responsabilidade no caderno Idéias em Transe que saiu ontem na tarde onde apresento um dos convidados do ano: David Byrne
A seguir o texto do amigo Trajano sobre outro convidado: Wim Wenders

David Byrne

Por Manellis

“...Debaixo do barro do chão da pista onde se dança, suspira uma sustança sustentada por um sopro divino...”

(Trecho de “De Onde vem o Baião”, Canção de Gilberto Gil)

De acordo com Gil, as emanações do divino chegam até nós transubstanciadas pela terra do lugar sob a forma de uma forte energia que transforma-se no som da sanfona, no balanço do cabelo da menina e que gera não só o baião mas também o xaxado, o xote e até mesmo a verde esperança que sai dos olhos e se espalha pela plantação.
A bela construção desta canção nos sugere a presença de um caráter “sísmico” na expressão folclórica. Pobre em vulcões, o Brasil é riquíssimo num tectonismo folclórico cuja importância para a cultura do mundo já foi identificada devidamente e vem sendo acompanhada há alguns anos pelos ouvidos atentos de um grupo de talentosos observadores internacionais. Um deles, David Byrne, estará este ano mais uma vez, entre nós na Bahia, agora como convidado do programa “Arte e a linguagem na cultura contemporânea”
nesta que é a primeira edição baiana do celebrado seminário internacional patrocinado pela Braskem, “Fronteiras do Pensamento”
Nascido a 14 de maio de 1952 em Dumbarton, Escócia, criou-se em Baltimore e mora atualmente em Nova Iorque; formou-se em design pela prestigiosa escola de Rhode Island e em arte em pela de Maryland. Artista multimídia na mais profunda acepção do termo, Byrne é lembrado por muitos por sua participação como co-fundador, de 1976 a 1988, no “Talking Heads” (Cabeças falantes) de Nova Iorque, grupo que ainda na sua primeira infância seria aclamado por crítica e público alcançando rapidamente o status de banda “cult” em função de sua condução inovadora para o pop da época; pelo jargão da informática poderiam ser definidos como um “hub” pop-funk: um nó físico de concentração e dispersão de influências.
O reconhecimento ao impacto de sua contribuição e ao universo de discípulos levou-o, em 2002, com os outros Talking Heads a um lugar definitivo no cobiçado Rock and Roll Hall of Fame.
Acontecessem no Brasil e estariam junto com os Mutantes e os Tropicalistas em qualquer antologia musical sob o verbete “Inovadores lírico-melódico-visuais performáticos”.
Atento ao bom do mundo, Byrne buscou influências em fontes de qualidade tais como Fela Kuti, Gil, Mutantes, Willie Colón, David Bowie e a The Dirty Dozen Brass Band para compor uma ainda aberta formação mosaiciforme e multicultural à partir do que mais tarde seria rotulado por críticos simplistas como “world music”, termo abjeto - execrado por Byrne - criado para envelopar, num mesmo pacote, um coral de Soweto, Miton Nascimento e Ravi Shankar.
Byrne, no entanto e para azar dos biógrafos e explicadores de plantão, nunca foi apenas um “talking head”; muito mais que isto, ele bem que poderia ser um “thinking head”, um “multi-brain” ou um “restless mind” sempre disposto a multiplicar sua agenda ad infinitum para acomodar projetos que já à época do Talking heads pareciam inconciliáveis para apenas uma pessoa: as partituras do balé “The Catherine Wheel” (um balé de Twyla Tharp para a Broadway de uma noite inteira de duração!), o complexo e evocativo álbum “My Life in the Bush of Ghosts” em parceria com Brian Eno (produtor dos T. Heads) onde promoveram uma fusão entre música eletrônica, música de países em desenvolvimento e vocais hipnóticos; seu próximo trabalho solo, em 1985, seria “The Knee Plays”: um projeto baseado na sonoridade das bandas de metais de Nova Orleans. Como se não fosse o bastante, incorpora o Oscar de 1987 ao currículo ao lado de Bernardo Bertolucci, ao assinar as partituras do filme “O Último Imperador. Cria o selo Luaka Bop em 1989 destinado a dar espaço a artistas da assim categorizada World Music. Ainda no mesmo ano, repetindo a experiência de 1984 quando os Heads foram alvo do comentado documentário Stop Making Sense, Byrne estaria agora atrás das câmeras para o documentário Ilê Aiyê: The House of Life (Ilê Aiyê: A Casa da Vida) tratando das teocosmogonias africanas no Brasil. Um de seus últimos trabalhos foi “Here Lies Love”, um projeto sobre a filipina Imelda Marcos com contribuições de Fatboy Slim, que estreou em março de 2006 na Austrália.
O leitor mais perspicaz, certamente, já intuiu que listar em comentários a totalidade da atuação de Byrne na arena étnico-musical do planeta até a atualidade, por falta de espaço, está fora do escopo deste artigo.
Paralela e surpreendentemente, sem deixar que sua formação em arte e design fosse relegada a coadjuvante no seu processo criativo, Byrne vem se envolvendo desde os tempos de colégio com projetos específicos nas áreas de arte e fotografia que vêem tendo divulgação mais intensiva ao longo da última década. Mantendo a linha dos seus projetos musicais, seu trabalho artístico se ocupa da esteticização do mundano e do banal; os micro e o macrocosmos emocionais e materiais são abordados de forma a enfatizar a semente do complementar dentro do tema tratado de uma forma, eu diria, quase cyber- taoísta.
Pois é, este sismólogo cultural estará entre nós neste alvissareiro 2008 falando para os 1500 participantes do Fronteiras do Pensamento onde talvez explique entre outras coisas como foi que se encantou pelo tectonismo e musicalidade de um até então esquecido e genial baiano: Tom Zé; ressuscitando-o para o mundo, para o Brasil e, por que não dizê-lo, para os próprios baianos.

Apareça e confira.


Win Wenders

Por André Trajano

“Quando a criança era criança, não sabia que era criança, tudo era cheio de vida e a vida era uma só! Quando a criança era criança, não tinha opinião... não tinha hábitos... sentava de pernas cruzadas, e saía correndo...”.

Os anjos de Wim Wenders são como crianças, não têm biografia. Wim Wenders tem.
E Wim Wenders foi criança alemã imediatamente após o final da segunda guerra mundial. Filho de cirurgião, aos dezoito anos iniciava o curso de medicina, substituido pelo de filosofia já no segundo ano. Este também não chegou a termo, e tendo feito vinte e um anos, lá foi ele pra Paris à busca de ser pintor.
Como não conseguiu uma vaga na Academia de Artes, achou por bem assistir a mais de mil filmes durante suas tardes na cinemateca francesa. Feito isso, foi estudar na recém-inaugurada Escola Superior de Cinema e Televisão de Munique. Deu no que deu.
Vamos considerar que não foi um inicio fácil, mas também não se pode querer que seja fácil o percurso de quem quer ser grande cineasta. Para isso nao há diploma, formatura ou passe. O cineasta se faz.

Há quem diga que ele faz cinema pela música: o rock de Bob Dylan e Jimi Hendrix em Alabama: 2000 Light Years Home ou as músicas de Van Morrison, Harvey Mandel e de Credence Clearwater Revival em Três LPs americanos.
Pensar na constelação de bandas e cantores que ele utilizou no filme Viagem ao fim do mundo (1991) como U2, Talking Heads, Lou Reed, Peter Gabriel, Elvis Costello, R.E.M., Depeche Mode, Neneh Cherrye Nick Cave chega a causar uma certa vertigem.
Há quem veja nele principalmente o olhar estrangeiro, estranho ao ambiente, alienígena, um anjo pairando por sobre o que se quer ver. No entanto, em relação ao que há para ser visto, o cineasta se declara um invadido pelas imagens, e bendiz o fato de usar óculos, instrumento que propicia o foco, como dito por ele, no documentário Janela da Alma, de João Jardim.
Há quem jure, por fim, que o ponto de partida do cinema de Wim Wenders é a cidade. Los Angeles, Tóquio, Lisboa ou Berlim, considera-se que ele escolheria a cidade antes mesmo de escolher enredo, personagens ou todo o resto.
E foi juntando música, olhares e cidades que Wim Wenders fez sua carreira.
Pode-se dizer que nosso convidado não conheceu o “calo do sucesso”. Após a fama obtida com o filme Paris, Texas (1984); seguida pela consagração com o filme Asas do Desejo (1987), ele só foi fazer as pazes com o público em 1988, com o filme Buena Vista Social Clube.
Receberemos em Salvador além do cineasta, um Wim Wenders professor, fotógrafo, publicitário em causas de interesse público, video-maker, presidente de academias de cinema e juri do festival de Cannes.

Teria ele parado de filmar?

Aos sessenta anos, durante o Festival de Cinema de Locarno, quando recebeu um prêmio pelo conjunto de sua obra, ele declarou que tinha que pensar se iria parar por ali. No mesmo ano lançou o filme Estrela Solitária.
Como ele vem ter conosco, alguém poderia lhe dizer que por aqui ele é bem quisto e um recordista. Em Salvador, o filme Buena Vista Social Clube ficou em cartaz durante oito meses, entre 2000 e 2001, e bem ali nos Barris – na Sala Walter da Silveira.
Em termos de longevidade em cartaz, posso afirmar como programador no circuito de cinema SALADEARTE, que ninguém lhe tirou a dianteira, quer entre os filmes de arte, quer no circuito Hollywood.
Como ele já está vindo mesmo, chega de especulações e vamos ouvi-lo.
Não sem algum cabotinismo provinciano, porém declaro: eu por mim ele vem, fala, ouve, olha a cidade, se invoca e faz um filme.

Hasta la Buena Vista!

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